Por obra
divina, pequenos seres acharam de se reencontrar durante intensivos quatro ou
nove, até dez anos. Mesma escola, cidades diferentes, realidades diversas, mas
a mesma intenção de retribuir tantos momentos bons. Momentos outros que não
foram tão agradáveis, a princípio, mas que nos trouxeram grandes lições para a
eternidade. Atualmente, nós nos encontramos no Zap Zap: Carmelita 1990. Emoções todos os dias.
O dia em que
Dona Maria Caiçara foi me abordar na entrada da escola ficou marcado. Aprendi
mais ainda a respeitar o outro, as diferenças, os limites do ser humano.
Aprendi a lidar com o medo. Aprendi a pedir perdão. Aprendi que devemos sempre
estudar a História. Mas, calma. Era a vida no ensino fundamental apenas
começando.
Quando Dona
Fátima Lucena, de forma silenciosa, apreendeu meu questionário e o entregou à
coordenação da escola, meu coração palpitou. Que decepção para a grande tia e
proprietária da instituição. Chorei o resto do dia. Mãinha já sabia de tudo
quando cheguei em casa, mostrando que estamos falando de Escola Nossa Senhora
do Carmo. Lugar de aprumar o espinhaço moral dos alunos. O meu estava no lixo. Levei
tempo para me refazer diante de mim. Gente precoce merecia castigo.
Foi aí que a
arte tomou conta dos meus princípios e comecei a escrever. À tarde, a escola
parecia um centro cultural. Era um ritmo bem puxado, mas consegui fazer as
atividades do matutino e conciliar com as aulas práticas de tapeçaria. Meu
álbum está intacto. Não vendo, não troco nem dou. Sim. Igual àquela égua de
Luiz Gonzaga. Dona Marlônia Abreu Pessoa, a quem chamávamos, com carinho, de
Tia Marlônia, foi a nossa professora dos bordados. Eu e Melquisedeque, o filho
dela, estudávamos na mesma sala. Melque, o codinome.
Nessa
disciplina em forma de oficina, fui começando a compreender que eu me via
diante de novas possibilidades da narrativa. As minitelas são narrativas. São
imagens se abrindo ao leitor, com seus traçados, envolvidos em tramas de linhas
e cores. Cores. Eis aqui um item indispensável para a minha criação. Ora, se a
própria criação da Natureza nos faz enxergar novas resoluções da luz, temos um
prato bem apimentado para outras crônicas. O problema é que, no momento atual,
a pimenta está na minha LAP – Lista de Alimentos Proibidos. Para não dizer que
não, ontem, no almoço, fiz essa homenagem simbólica e silenciosa ao meu velho
Painho. Três gotas de um molho malagueta. Ele gostava de uma pimentinha lascada
e, ele mesmo, de produzir o molho, como um gurmê masterchefe. Eita. Saudade.
Entonces, se a
pimenta está no meu LAP, Painho não vai se zangar se eu der um tempo dela, para
viver melhor nesse plano terrestre. O restaurante onde almocei, ontem, estava
tocando samba. Muito alto, às vezes, mas deu para apreciar o genuíno samba dos
povos dos morros da Grande Vitória. Um luxo. Um dos sambas inesquecíveis para
mim, sempre, é entoado por Beth Carvalho, Coração Feliz: uma excelente
oportunidade para dizer que sou de paz. A escola ensinou isso bem direitinho e
ai de quem ousasse guerrear.
Aquela escola
não seria a mesma sem as mãos majestosas de Dona Margarida, Margô. Que delícia
aquele chazinho de qualquer coisa que curasse nossa eventual dor de barriga.
Morava perto da sede da Orquestra Santa Cecília. Servia água na hora do recreio:
as canequinhas eram de plástico azul. Cuidava da alimentação da amiga Carmé,
quando esta ficava horas na escola, ou seja, relativamente longe do aconchego
do lar. E Margô sempre com um sorriso aberto, sincero, vibrando com nossas
conquistas.
Na ENSC,
aprendi a dar mais valor ao estudo. Aprendi a dar mais valor ao sonho. Pois é
claro que aquelas monumentais paredes erguidas sobre um alicerce de boas pedras
nunca teriam existido se não fosse o sonho. Se não fosse o sonho terno de uma
jovem moça religiosa, que queria construir uma escola de qualidade e fincada no
caminho de Nossa Senhora, Maria, a mãe de Jesus. Caminho de servir ao próximo. Mais
saber para o sertão.
Há detalhes
naquele lugar, nos dez anos que por lá fiquei, que jamais seriam pagos com uma
simples mensalidade. São elementos eternizados. São elementos que me sacodem para
a vida. São elementos que estão em outra LAP – Lista das Atitudes Proibidas.
Uma delas é: não desvalorize seu sonho. Isso eu estou dizendo para mim, mas
pode servir pra algum leitor aí, que acha que tudo acabou.
Olha, Taiguara
se foi, mas a música eterna dele está aqui, quentinha no meu ouvido. Portanto,
amigo e amiga, a arte aproxima o que a gente menos imagina. Touchê. Saudação de
fechamento em homenagem a um leitor eremita e secreto. Beijos da coleguinha.
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