Mercado Central: início dos anos
de 1980. Eu procurava fazer tudo certinho, ser bem obediente e comportada nos
lugares, sabendo que havia a possibilidade de ganhar um pão doce com garapa.
Garapa, que eu digo, é caldo de cana. Claro. Pois é. Ir ao Mercado era um
presente, uma premiação, algo que eu pudesse desfrutar, degustando cada
compartimento daquele conjunto de informações para a minha cabecinha de
criança. Parecia um parque de diversões. Luzes, cores, gente, música, conversa.
Chegávamos em Dona Lormina. Gente, o que era aquilo? Botões: centenas. Formatos diversos, texturas várias, finalidades combinadas. Um mundo. Cores, tantas, muitas, à distância. Isso mesmo. Eu observava a certa distância regulamentar, com mãos para trás. Olhos ligadíssimos. Acompanhava o funcionamento daquela complexa tecnologia de pregar botões com uma máquina, que parecia um brinquedo. Sim, era meu brinquedo platônico.
Pensando bem, o que eu faria em
casa com tal engenhoca, não sei. Estou falando aqui de uma menina com seus seis
anos de idade. Segundo a metragem da sujeita, pequena repórter, a máquina era
gigante, objeto tão difícil de manipular quanto um trator. Quando eu chegava em
casa, relatava minhas andanças para as minhas bonecas. Falava de uma banca de
uma tal de Dona Losmina. Aí eu não entendia se era Losmina ou Lormina.
O Mercado guarda uns mistérios
nos seus frequentadores. Não é possível que aquele teto fique silencioso ao
tempo, sem ao menos esconder um segredo, uma treta, um enigma. Cada banca, uma
parte do labirinto. Andando mais um pouco, lembro bem da família Mareco. Mais
de um ponto comercial e sempre o mesmo sorriso e a forma anfitriã de tratar os
visitantes. Às vezes, acontecia de me encontrar com Lucilândio, meu colega da
Escola Nossa Senhora do Carmo. Lu é Mareco e Pereira.
Lembro com carinho de Auxiliadora
Leite, Bia, na banca de Seu Geraldo. Bia me conhecia desde criança, andando no
Mercado com minha mãe. Depois, Bia acompanhou minha morada no Alto Belo Horizonte,
dos nove aos dezesseis. Sempre ao visitar meus familiares naquele bairro, era
comum parar e tirar três dedos de prosa com Bia, Fátima, e outras tantas que me
acompanham, como a família de Seu Casimiro. Edinaldo, Erivaldo, Neta, Neide,
Neida e outro grupo pelas calçadas, a desejar boas-vindas aos velhos
conhecidos. O povo do gesso, um vai e vem de trabalho, histórias e festas. Tem
mais gente: deixemos para outra crônica. Bia agora está noutro mercado, com anjos
celestes; lá não se negocia qualquer linha, fita, lã ou agulha; o local deve abrigar
painéis flutuantes com milhares de cores, inclusive as que nem conhecemos.
Que alegria sorrir para as
pessoas, no meu shopping center. Olha, como ela está grande. Hum, já teve
piolho. Olha, ela sempre passa de ano na escola. Olha, ela gosta de estudar. Olha,
ela vai ser anjinho de Nossa Senhora. Olha, parece com o povo das Melancias.
Muito bem. Depois de andar à vontade, era hora de tomar garapa. Confesso que eu
ficava esperando mais pelo pão doce do que pelo caldo. Mas eu traçava os dois,
sem dó. A sobremesa era um picolé da Walmor ou um tubo de dropes.
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